Falar de homens com a igual
notabilidade de José de Mattos Pereira não é tarefa das mais fáceis a se
executar. É preciso voltar no tempo para conhecer a sua epopéia histórica,
marcada pela sua intrépida coragem e audácia conduzindo sua numerosa prole para
terras de paragens distantes de sua terra de origem. É preciso rememorar a
façanha deste homem para que todos os descendentes de sua raiz possam se
fortalecer de forma audaz e corajosa diante das tomadas de decisões pelas
caminhadas da vida, seguindo desta forma o exemplo deixado pelo seu venerando
patriarca.
José
de Mattos Pereira chegou em 1902 nas terras que hoje corresponde à cidade de
Dourados - MS. Partiu da cidade gaúcha de São Luiz Gonzaga contando a idade de
74 anos. Apesar da idade já avançada, conduziu bravamente seu clã, atravessando
as paisagens gaúchas dos pampas e coxilhas, que foi deixando para trás regadas
de lágrimas. Trazia o coração varado de dor e cheio de recordações de momentos
vividos harmoniosamente com a sua numerosa família na terra amada.
Há
que se reconhecer neste homem a sua estirpe e a sua coragem, que o fizeram
acreditar que a retirada do seu povo do rincão gaúcho para terras distantes do
hoje Mato Grosso do Sul, era a forma mais digna e honrosa para dar continuidade
aos descendentes de sua linhagem, aos quais considerava dignos de seu amparo e
proteção. Assim decidido, juntamente com os filhos da primeira esposa – Ignácia
Maria de Jesus, e a esposa de novas núpcias – Lucinda Beninha dos Santos,
reuniu todos os filhos, filhas, genros, noras, netos e muitos agregados a quem
eram extremamente afeiçoados, e migraram para as terras de Mato Grosso, destino
onde o filho primogênito Ponciano de Mattos Pereira já os aguardavam.
A
sua caravana composta de mais de uma centena de pessoas, marchou por
prolongados meses por caminhos íngremes e até mesmo inexistentes traçados a
hora da travessia com facões e machados. Foram muitas as noites mal dormidas
sobressaltados pelos perigos da mata e a incerteza de segurança com a vida de
seus entes queridos. As carretas puxadas pelos bois seguiam à frente fazendo
zunir suas rodas pelos caminhos incertos qual fossem sussurros em tom plangente
e calado no fundo da alma de cada um dos que seguiam a marcha silenciosa se
despedindo dos rincões gaúchos.
Nas
carretas vinham as mulheres, as moçoilas e as crianças que eram trazidas com
especial atenção, pois eram mais frágeis que os homens, portanto, inspiravam
maiores cuidados. Elas eram as esposas, as filhas, as netas, as agregadas e os
pequeninos de colo. Também, no conjunto das carretas, seguiam as que transportavam
algumas espécies de víveres a exemplo do charque e gordura animal,
indispensáveis para o preparo dos alimentos. Outras levavam ferramentas como
facões, machados, enxadas, foices, enxadões, arados, semeadores e traias para o
arreamento de cavalos. Ao lado destas, seguiam as carretas que conduziam os
mimos de cada família, constituídos de pertences de extremo valor sentimental.
Durante
o trajeto, foram muitas as dificuldades enfrentadas com as doenças, a falta de
alimentos e remédios, também, gêneros de uso para vestimentas e higiene. Muitos
entes queridos ficaram pelo caminho, pois tombaram sem vida, e, pranteados,
foram deixados entregues à Mãe Terra. Apesar de tudo, seguia à frente o
patriarca José de Mattos Pereira, resoluto e pertinaz, trazendo no âmago do ser
a confiança e a certeza de conquistarem novamente os dotes da família que
abandonaram ou se desfizeram por qualquer insignificância. Pressentia o
destemido condutor que as mesas seriam fartas novamente, e que as habitações
seriam tão confortáveis como as que deixaram na terra natal. Que a sua gente
seria audaz nas terras dos ervais quanto foram nas terras dos pampas!
Embalado
por novos sonhos, José de Mattos Pereira idealizou sua geração projetada na
nova terra como homens honrados, trabalhadores, assumindo lideranças e
participando da construção de uma sociedade para nela prosperar e viver os
descendentes de sua prole, que hoje representam a Família Mattos, na sua grande
maioria radicados em Mato Grosso do Sul, e que originaram os troncos de: 1. Ponciano
de Mattos Pereira, 2. Manoel de Mattos Pereira Sobrinho, 3. João de Mattos
Pereira Sobrinho, 4. José de Mattos Pereira Filho, 5. Maria Ignácia de Mattos
Pereira, 6. Francisco de Mattos Pereira, 7. Antônio de Mattos Pereira, 8.
Joaquim José de Mattos Pereira, 9. Cândida de Mattos Pereira, 10. Bento de
Mattos Pereira, 11. Amândio de Mattos Pereira, 12. Anna Ignácia de Mattos
Pereira, 13. Ignácia Maria de Mattos Pereira, 14. Florência de Mattos Pereira,
15. Carmelina de Mattos Pereira.
Quantos
galhos a frondosa árvore estendeu pelas terras meridionais do hoje Mato Grosso
do Sul! Quantas sementes espargidas e lançadas ao chão da Nova Canaã de MS!
Quantas sementeiras lançadas nos sulcos profundos da terra abençoada e
acolhedora que acabariam por transformar na cidade de Dourados-MS, considerada
atualmente como o novo reduto da Família Mattos! Qual fosse São Luiz Gonzaga no
Rio Grande do Sul!
Entranhadas
no chão avermelhado da nova terra, as sementes trazidas pelas mãos do valoroso
condutor da Família Mattos foram depositadas para florescer e frutificar. De
todas elas, o velho patriarca pode hoje se orgulhar, pois todas foram capazes
de prosseguir a sua grandiosa missão. Na chegada, a faina era ainda muito
grande e o trabalho árduo, se reverteu mais tarde na construção da sede do
município douradense. Para muitas ruas, praças, logradouros públicos, aeroporto
e rodovia, os Mattos emprestaram o seu nome. Sobre essa afirmação, assim afirma
OWENS: “A participação dos Mattos na construção de Dourados foi efetiva em
todos os sentidos. Começaram no início do século, desbravando matas, abrindo
estradas, construindo pontes e casas. Foram lavoureiros, criadores de gado,
educadores, enfim, influenciaram de maneira decisiva na formação do povo que se
iniciava” (2000, p. 291).
Resgatar
as páginas épicas desta façanha histórica nos envaidece e nos orgulha. Faz
brotar em nossa têmpora o sangue dos bravos que nos antecederam, e, ergue alta
a insígnia e as armas das ‘quintas’ dos Mattos em terras lusitanas onde tudo
teve o seu início. É de lá que foi transladado para as terras brasileiras, a
força, a grandeza, o mando e a coragem como bem retratam o brasão da Família
Mattos.
Por
ocasião do 23º Encontro da Família Mattos (01/06/2013), as gerações de
descendência do patriarca e líder maior da Família Mattos: o inesquecível José
de Mattos Pereira, estarão mais uma vez reunidos na cidade de Dourados/MS, com
o objetivo principal de manter acesa a chama da união que entrelaçam as
famílias dessa mesma origem. Considera-se o momento muito oportuno para prestar
esta homenagem em nome de todos os seus descendentes indistintamente.
Que
o espírito de gratidão e reconhecimento ao ilustre personagem possa se
transformar em mantra sagrado desfraldado nas alturas, orvalhando-se de
fragrâncias raras para ser depositado sobre a lápide mortuária do nosso grande
herói José de Mattos Pereira, que repousa desde o dia 11 de março de 1904 no
cemitério do lugar denominado “Falha”, no Distrito de Picadinha no município de
Dourados-MS.
Sem
nos ater apenas à genealogia, mas, pela trajetória de vida, podemos afirmar que
José de Mattos Pereira é, sem dúvida, um marco valoroso na construção histórica
de Dourados-MS
*Professora
MSc. alaide@uems.br
Graduada
em História (Fucmat), Bacharel em Turismo (UCDB), e Mestre em Geografia (UFMS).
Fonte
bibliográfica: o texto foi produzido com base nos relatos orais de membros da
Família Mattos e na obra de Owens, Marli Carvalho. Mattos – A saga de uma
família. Dourados-MS, 2000.